Posted by : Alison Nerv 10 de jun. de 2012


Bom, finalmente eu terminei de assistir a primeira etapa de Gundam Age – e posso dizer com certeza que na minha humilde opinião, ela tem sido a melhor série Gundam em MUITO tempo. E digo isso friamente; é praticamente a única série animada japonesa recente (salvo Bakuman, que acompanho em sua natureza de adaptação de um dos meus mangás favoritos – e isso não conta) que me fez prosseguir regularmente na missão de assisti-la até o fim, principalmente levando em conta todos os descaminhos que as franquias de animação vem enfrentando (não queiram saber minha opinião sobre Macross Frontier, MESMO).
Gundam AgeNa verdade, a partir de certo momento, ela me empolgou de verdade. Mas acho que há motivos claros para essa empolgação que valem a pena ser pontuados.
Em primeiro lugar, vamos a história em si. Justiça seja feita, ela não oferece realmente nada de novo. Na verdade, é uma jornada do herói clássica: um personagem perde a mãe (graças a um invasor desconhecido e misterioso que destrói a colônia espacial onde todos viviam) e ganha dela uma missão. Ele encampa o papel de salvador dessa missão e vai seguindo sua jornada de crescimento pessoal até seu combate definitivo (bom, por ora) com o inimigo. Há um pequeno twist no final da primeira etapa, verdade, mas chegaremos lá – e ela serve mais ou menos como a cereja do bolo de algo trabalhado na trama, se olharmos bem. E antes que vocês perguntem qual o grande mérito nisso tudo, é melhor irmos direto ao ponto.
1. De Volta ao Básico: Gundam Age surgiu como um produto voltado a um público infantil – e muita gente por isso mesmo esperava da série algo idiota. Já falei antes sobre a importância da produção infantil – e sendo honesto, boa parte dos longas de Hayao Miyazaki como Kiki's Delivery Service e Meu Amigo Totoro são feitos para crianças enquanto tralhas como os mangás Yomeiro Choice e Hozuki-san chi no Aneki são feitas para um público supostamente amadurecido. Quem é realmente idiota aqui?
Gundam AgeMas ao contrário do que se imaginava, o que veio não foi um material ao estilo Eldoran ou Yuusha (para falarmos de franquias infantis de robôs gigantes) com o nome Gundam no meio. A abordagem para um público mais jovem foi simples: apresentar elementos fundamentais de forma clara, simples e objetiva, e despir o material de toda a gordura agregada ao longo de décadas; comparativamente falando, foi como a volta aos três acordes básicos nos anos setenta, após os excessos do Rock Progressivo – que por mais que tenham dado sua cota de obras muito bacanas, geraram excessos que deixaram o rock cansado, balofo e pouco divertido. Isso também gerou a revolta de quem se interessou por Gundam por conta dessa gordura agregada (como a ala fujoshi pós-Wing, a macrossização de Seed ou até os adendos estranhos de Gundam 00 – sim, eu não esqueço da ameaça alienígena de Awakening of Trailblazer), mas foi ela quem ajudou a desgastar a franquia ao longo dos anos. Em miúdos, apesar da criançada, é Gundam de verdade – sem o aparato que ajuda a desviar o foco do espectador da natureza de uma série Gundam. E se sai bem nisso.
2. Clareza e Objetividade: A decisão de dividir o material em três fases relativamente curtas (a primeira fase teve quinze capítulos e imagino que não vá ser diferente nas fases posteriores) somada à essa proposta, gerou um ponto interessante: talvez seja o gundam mais linear e objetivo de todos os tempos. Porque estruturalmente, Age não foi pensado exatamente como uma série grande: são três séries pequenas com um eixo sequencial de continuidade.
Gundam Age
Então temos uma trama bem clara desde o começo e praticamente não há tramas paralelas; no máximo temos linhas de argumento acessórias que em determinado momento vão ser inseridas na trama principal. Isso vale tanto para o elemento romântico quanto ao mínimo de política necessário para a história funcionar. Então é possível sintetizar bem a trama principal em poucas linhas.: Capitão e piloto são unidos por um ataque a seu mundo e partem em uma jornada para a grande base invasora, que ninguém acredita – por isso são caçados pelo governo que os tem como rebeldes. A cada parada eles fazem aliados, que não são muitos (e por isso não temos sensação de repetição de eventos)...
Gundam Age
... e todos eles se reúnem no ataque final. Toda sub-trama simplesmente desemboca na trama principal e não perde muito o tempo do espectador, e elementos extras são expostos de forma quase didática: Foi mais fácil entender como funciona o poder de um newtype (okay, eles não tem esse nome aqui, mas todos os escolados na franquia gundam entenderam muito bem o que é um x-rounder) em Age do que em qualquer outra série Gundam até hoje. Não é algo ofensivo ou estúpido: é feito pra qualquer guri poder entender; logo, Gundam Age prima por uma clareza narrativa e conceitual que agregou à trama, ao invés de diluir.
Gundam Age3. Personagens Heróicos: Imaginem, hipoteticamente, que em 1979 a Sunrise NÃO tivesse deixado o Tomino fazer do Amuro um personagem mais realista, que é afetado pelos efeitos da guerra. Por mais que este tenha sido um passo importante para o amadurecimento dos animes, nas mãos de gente menos competente isso acabou por diluir paulatinamente a capacidade de se construir personagens carismáticos (o mesmo efeito que fez com que obras importantes e valiosas como Cavaleiro das Trevas e Watchmen fossem decisivas para os quadrinhos rasos e violentos de super-herói dos anos 90) – em um processo que desembocou em personagens como Shinji Ikari de Evangelion (e dele já falei AQUI mais do que o suficiente). Hoje, é difícil surgir personagens realmente dinâmicos, assertivos e carismáticos fora de revistas como a Shonen Jump – e quando isso acontece na animação japonesa, tende a ocorrer sob um viés saudosista e retrô, no melhor estilo "bons tempos aqueles".
Gundam AgeGundam Age deu, é verdade, um deliberado passo atrás em relação a 1979, com um personagem bem intencionado, firme e confiante. No entanto, ele nem de longe é um personagem retrô (e na verdade, Gundam Age não é em nenhum aspecto uma série retrô). A experiência da Level-5, equipe que produziu Super-Onze (Inazuma Eleven), foi preciosa aqui: criou-se um protagonista corajoso, heróico e motivado por senso de dever, mas não farsesco nem exagerado; alguém que um garoto de hoje pudesse reconhecer como alguém identificável, e que mesmo suas eventuais – vejam bem, eventuais – angústias fossem válidas em relação ao momento, e não mero chororô.
E isso não se limita ao protagonista. Ao invés das mortes trágicas de obras como Zeta e V Gundam, entramos em um terreno mais folhetinesco, de sacrifícios heróicos ou vinganças melodramáticas. Isso só adiciona um aspecto mais novelesco que funciona muito bem para a série – e o destino final do capitão Grodek no capítulo 15 só acentua essa sensação de heroísmo (Alerta de Spoilers: isso era meio que previsível, sim, mas no fim das contas ele foi, de todos, aquele que pagou o maior preço por fazer o que é certo. E ele já esperava o que iria acontecer. Se pensarmos bem, heroísmo maior do que isso não tem).
Gundam Age
4. Shonen Gundam: desconfio que esse venha a ser o elemento mais polêmico para fãs velhos de guerra, mas para sua proposta juvenil é mais do que adequada: o personagem se torna gradualmente mais forte em relação a novos oponentes. A gambiarra criada para tal fim é o Age System que batiza a série: sempre que o personagem tem seus limites definidos pela capacidade do oponente, uma programação conhecida como Age System cria uma arma nova ou uma forma extra para o robô – com novas capacidades. É o elemento "mais anti-gundam" do material, mas justiça seja feita: ele não é onipresente nem se torna uma muleta. Podem reparar que ao longo da primeira fase temos apenas Gundam Agetrês formas para o Gundam – e uma delas é a básica. E levando em conta o que já foi feito com Gundam ao longo dos anos, um "Beam Lariat" (vocês vão descobrir o que é) não chega a ser um "extra" tão grave assim, sendo bem sincero.
Mas esse crescimento não chega a ser o único empréstimo criativo d0 shonen (leia-se, material produzido para garotos): a mais longa parada dos personagens, no mundo de Fardain, no fundo é um núcleo fabular sobre conciliação e respeito que poderia ser muito bem um arco de aventura passado em qualquer shonen mediano, não fosse o fato de que – como tudo é construído em prol da espinha dorsal da trama – não é um mero incidente e os personagens dali se tornarão presentes até o fim da fase. A concisão faz com que nada se perca realmente.
4. Sem Medo de Riscos: uma das artes mais difíceis de se dominar é a de se equilibrar elementos maduros em uma série juvenil – que estão lá justamente para deixar claro ao seu público de menor idade que o mundo não é um lugar tão legal, e que mesmo que haja saída para a pior das situações, é bom se preparar para todo tipo de gente ruim que cruza o seu caminho. Um autor que sabe muito bem fazer isso é Eichiro Oda, em One Piece: há um clima positivo dado pelos personagens, que são heróicos, divertidos e sempre "para cima".
Gundam AgeNo entanto, há vários backgrounds trágicos no elenco e se analisarmos friamente, o universo de piratas e marinheiros da série é talvez um dos cenários mais sombrios dos quadrinhos juvenis de aventura; gente comum está à mercê de situações horríveis e sem esperança – até que surgem os heróis, como a luz em meio as trevas. É fácil pesar a mão nesse terreno – e One Piece é um exemplo de como é possível se trafegar por essas sombras e manter a série "para garotos". Já Gundam Age o faz de forma competente, mas trabalha de forma diferente: introduz sombras em pílulas desde o primeiro episódio – e já sabemos que a federação terrestre está longe de ser boazinha. Mas o final da primeira fase é uma paulada, e agora os espectadores sabem que o final feliz está longe de ser garantido. Os heróis são heróis – mas o mundo que os cerca é cruel, remetendo à postura de um Go Nagai, de contar histórias duras para um público jovem, preparando-o para a vida. É verdade que os tempos são outros e mesmo o herói foi poupado de cometer não uma, mas duas execuções na reta final de sua saga, mas faz sentido: ao fim, o inimigo foi vencido mas o coração do personagem principal está marcado para sempre – ele não pode ser mais o herói nobre e de motivações límpidas de antes; é o preço de sua vitória.
Gundam Age
Conceitualmente, a passagem de tempo ganha uma nova conotação conceitual: Ele deve passar o bastão não apenas de protagonista, mas dessa nobreza de intento que ele perdeu – e por isso mesmo não pode encampar mais. Por isso o salto de tempo se torna, em termos estruturais, algo necessário. Se o Flit era o herói nobre e digno, movido pelas melhores intenções, Grodek era por assim dizer a figura (estruturalmente) paterna, experiente, seguro mas marcado demais pelas dores da vida para ser um herói luminoso e bem-intencionado. Agora cabe a ele sentar na cadeira e servir de apoio a um novo herói, como um dia ele foi e de agora em diante não pode ser.
Se isso não é um mérito e tanto em uma série que desde o começo se assumiu como um produto infanto-juvenil, não sei mais o que é.
Gundam Age
E agora? Em um cenário em que eu só assisto aquilo que consegue me agarrar, e já abandonei várias séries ao longo dos últimos anos sem retorno, posso dizer que Gundam Age já me ganhou – sem aquele espírito de assistir "por obrigação" que me leva a completar algumas séries sem ânimo. Vamos acompanhar a segunda fase da série e ver se ela mantém o nível. Claro, ela vai trazer de volta o famigerado clichê do "clone de Char" que ficou ausente da primeira série, mas paciência – a essa altura do campeonato todo mundo já espera algo assim.
O ponto é que com Gundam Age (se o nível for mantido até o final) e, para os tradicionalistas, Gundam Unicorn, essa voltou a ser uma boa época para se assistir Gundam. E em tempos de vacas magras na animação japonesa, isso não é pouco. Nem de longe.

Fonte: http://www.interney.net/blogs/maximumcosmo/


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